quinta-feira, 10 de março de 2011

Gaveta

Acho que há um bocado de mim perdido por aí, nos sonhos que tenho, coisas que acho fantásticas, planos que traço, listas que escrevo.. E perdido porque vou exatamente engavetando tudo em arquivos bem separados, para que estejam organizados o suficiente quando eu puder voltar pra eles. Só que nunca sei quando vou retornar a esses arquivos e, quando acredito que realmente vou fazê-lo, dá uma empolgação súbita de 'agora vai', como pegar fôlego antes de mergulhar. Só que aí o dia acaba, eu durmo, e o que realmente vai me tirar o ar - e todas as coisas da cabeça - é a rotina do próximo dia.

domingo, 21 de novembro de 2010

La voyage de la petite

  Tem uma janela de madeira e vitrais coloridos aberta em duas partes, e o mundo imediato lá fora só serve para lhe emprestar o cheiro de planta.
  Para as estrelas que ela precisa ver, tem que se buscar em terras mais distantes que aquelas, em céus de pesos fenomenais, e o calor que precisa sentir... Bem, esses hão de ser colecionados a medida que os mais distintos braços se estendam e devem carregar consigo o precioso mérito de existir.
  Guarda as estrelas em seus botões de mundo, os olhos da pequena, e carrega os abraços no colo, como se carregasse o primeiro dono deste que agora é seu, até que esteja inundada pelo calor de mil sóis e estes se choquem ao estímulo musical.
  As estrelas então brilham para outros olhos e podem até derreter em finos rios. O calor a ser transmitido junta seu colo em outro, envolve braços e sela um abraço. Depois sorri em despedida, porque o mundo se reproduz em pessoas que carregam calor em si, vivem sob imensos céus e olham para estrelas toda noite. Mas o que se busca é aquilo que não se vê.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Úmido

  Não sei se é uma característica de todas as pessoas da minha espécie de gente ou desse mundo que só eu habito, mas volta e meia acho que derramar todo choro é o que deve ser feito. Essa inundação violenta que se abate dentro do corpo - por fora sólido - nada resolve se ficar ricocheteando nas paredes do tórax.
  Começa pelas mãos. 
Os dedos procuram qualquer superfície tamborilável, mas essa parte eu acredito que seja só minha. Isso das mãos denunciantes. E também se não for, se tê-las agonizantes for patológico do ser humano, pouco me importa. Cada um acredita ser especial justamente por aquilo que guarda a sete-chaves, justo por medo do seu precioso ato-falho ser o de outro também. 
Depois vem o fôlego, a respiração, 
e aqui não vou ter a audácia de dizer que é particular meu. Eu mesma já vi muitos colos subindo e descendo; narinas dilatando/contraindo, e é assim mesmo. Meio feio, como se estivesse afogando por dentro e daí o que se faz  é olhar para qualquer lado. Quem sabe até virar os olhos para dentro de si, a fim de não encontrar as janelas oculares enxutinhas do indigente que está bem à frente. O que o brilho dos olhos quer dizer nesse momento é "tomara que o vento passe e seque meu olho". Mas isso não vai acontecer, meu caro. Pode até ser que o vento passe, mas há uma enchente inteira querendo sair e o ser mais próximo irá te abraçar sem dúvida alguma. É um tanto ritualístico isso, inclusive. 
  O que acho então é que os olhos deveriam berrar "corram para as montanhas!", mas o que conseguimos na verdade é um colete salva-vidas. Não reclamo. Quando acontece de um rio inteiro me invadir, eu quero mais é que transborde, como tudo em mim.
Não resolve. Não acalma. Não reestabelece a homeostase da alma.
   Se não é para me preencher por todos os cantos, melhor que não comece a fazê-lo. 
  Ao chorar, sinto mesmo é que vou ser abraçada pelo mundo, que vou deitar nos ombros do meu Deus e a providência me agradecerá por estar irrigando sua terra com pingos de mim. brotarão então pequenas folhas e caules que serão troncos logo mais. Nascidos para me dar sombra.


terça-feira, 13 de julho de 2010

Não é

necessariamente não gostar de quem eu sou.
Mas odiar tanto a agústia de demorar para ser.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Hoje a noite, aqui na selva, quem dorme é um Leão

Você fingiu que ia embora e seus olhos se despediram de mim. No vácuo do vento que você não deixou ao pouco passar eu soube o que é a culpa. Você não tem como saber o peso de uma culpa de 9 anos, criança. Cabe dizer que cheira a molhado, cor de coleira primeiro rosa e depois azul. Lembra promessas que você nunca ouviu, mas sempre acreditou, desejando com um modo insuportável de latir.
Preferia aquela brincadeirinha ridícula de me assustar ao pular em mim quando a janela clareava, acordando-me, a essa de chamar a minha atenção perdendo um pedaço seu. Ao ter medo de te perder, só pensava - e chorava - que você nunca foi o grande cachorro que quis, mas a amiga que precisei ter.
Agora continua acreditando em mim, com o mesmo ar bobo de sempre, e eu continuo te cuidando, com esse amor desleixado da vida toda.

Contato

Se pra tudo há razão nessa vida, por favor, alguém venha me dizer. Esclareça que felicidade assim não dá pra ser de um alguém só. Que seja só então aquela que quer um mundo inteiro pra si.
Que venha a me explicar, vontade por vontade, que a mim é permitido só imaginar um sorriso do tamanho de um céu, um toque que me faça mar.
Espero que venha me dizer que acordar e olhar nesses olhos me tornará cega, que estar nesse calor me fará perder uma mão.
Por favor, justifiquem agora. A distância é mais bondosa corroendo um coração.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

De Fato, Condicional

E se eu explodisse, e meus estilhaços abrissem carnes, perfurassem peles e rasgassem ouvidos.
Se os olhos se fechassem e as bocas se abrissem em espanto.
Se de todos os corpos o sangue jorrasse, depois escorresse e, enfim, se derramasse em dó lenta.
Eu pairaria então em sarcasmo como sal em ferida.
Meu sorriso giraria em torno do sol. Meus braços ao redor de mim.
E todo esse fluido sanguíneo então seria um rio, que nunca, nunca pararia de correr. Molharia os meus pés e encharcaria a ausência das minhas roupas. Subiria pelo pescoço e invadiria a garganta, que, afogada, pediria que estancasse.